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quinta-feira, 22 de abril de 2010

Grandes Êxitos do "Braganza Mothers", evocando Amélia das Marmitas - "No dia da morte da "Amélia das Marmitas"




Hoje foi dia "não": andei atarefadíssimo, preocupado com o clima de roda livre de Portugal, e cheguei tardíssimo a casa, e, ainda por cima, a única coisa -- deus me perdoe... -- que me fez rir foi a morte de uma pessoa.
Não há pior coisa do que nos comunicarem um óbito e nós não nos lembrarmos do nome do defunto, e só nos vir a alcunha, mais célebre do que o Mundo, à cabeça.
Pois estava eu sentado defronte do Represas, vira-se ele para mim, e diz assim, "sabes quem é que morreu ontem?...", e eu, "sei lá...", a mentalmente olhar para o mapa demográfico do Mundo, deve morrer um chinês a cada segundo, e um indiano a sonhar com um derradeiro grão de arroz, quando fecha os olhos, já para não falar de um palestiniano-bomba, que se foi juntar às 100 000 virgens, "pois", dizia ele, "morreu o Zé Manel...", e eu lembrava-me lá de quem era o Zé Manel, até que se me fez luz, do tipo daquela com que Jeová criou o Mundo, e soltei -- deus me perdoe -- o que não devia ter dito, mais um sorriso por acréscimo, "tu não me digas que morreu a "Amélia das Marmitas"?...
Sim, a "Amélia das Marmitas" tinha morrido.
Para quem o conheceu, suponho que tenha a sensibilidade da perda infinita que isso representou, para o submundo barroco lisboeta; para quem a não conheceu, vou tentar descrevê-la, à minha maneira, em três penachadas.
A "Amélia das Marmitas", para a geração dela, era um ícone "gay" incontornável, como a "Coxa" da Rua do Salitre, a "Zarolha", substancialmente mais nova ou a "Micas", a boneca de cera, para a geração dos trinta/quarenta.
Conhecia-a já na fase terminal, embora me tenha assombrado a adolescência, como a muitos lisboetas bem traçados, e confesso que fugia "dela" a sete-pés, o que agora lamento, porque uma boa parte da crónica subterrânea de Lisboa foi com "ela", ontem, para o túmulo.
A Amélia das Marmitas celebrizou-se em todos os lugares que frequentou, aliás, "ela" tornava célebres todos os seus antros de frequência, e que não eram poucos, já que o Zé Manel, como tantas bichas militantes da capital, gozava do dom da ubiquidade. Suponho que fosse uma espécie de "franchisng" acordada entre ela e Deus Pai, já que nunca vi ninguém tão omnipresente como aquela figura... Sobreviveu a duas "perestroikas", a do encerramento dos chichis subterrâneos do Rossio, onde, diariamente, se rodavam as piores "Nove Semanas e Meia" a que a Ulissipónia "underground" assistiu -- nada disso é do meu tempo, mas tenho relatos fidedignos, uma meia lua, na obscuridade, escavada no chão, bem perto das fontes onde agora vendem flores, mas, outrora, no tempo do Cesariny, se faziam "botões-de-rosa", e de onde os cavalheiros depois emergiam para a luz do dia, como se nada se tivesse passado -- e acabaram por amparedar aquilo, embora suponha que ainda lá esteja, tipo cripta do Tutankhamon, e, um dia em que façam arqueologia, decerto lá encontrarão alguma dentadura caída no chão, nalguma aflição das célebres incursões da Polícia, a A.S.A.E. da época, que sempre andou mais preocupada com os broches clandestinos do que com os "off-shores" desta pocilga...
A Amélia sobreviveu à "perestroika" dos chichis do Rossio, e a duas "perestroikas" ainda mais graves: o abate dos sanitários da Estação de Comboios do Cais Sodré, onde a fina flor dos gajos do "Kremlin" acabava, às cinco da matina, para vazar colhões na boca das bichas esfomeadas que por lá zanzavam, e o fim de uma das coisas mais patrimoniais que Portugal já produziu, as retretes do Terminal do Rossio. Aparentemente, o Monhé da Câmara de Lisboa ainda quer dar o derradeiro golpe no último ossário dessa época, o Mamadouro de Santa Apolónia, mas talvez tenha de recuar, com o seu célebre vereador, Sá Fernandes, simultaneamente titular das moitas de Lisboa, e do pelouro dos Enrabadouros, Punhetórios e Brochanários da Cauda da Europa.
A Amélia das Marmitas era ímpar: tinha uma coisa nas pernas que eu nunca percebi muito bem o que era, mas era uma fibro-qualquer-coisa (os comentadores depois ajudam, tá bem?, que eu, para Medecina é como para o Futebol, tou no zero...). Para mim, simplificadamente, tratava-se de uma poliomielite, que lhe tolhia os membros inferiores, e o obrigava a permanentemente usar umas canadianas, que, diga-se de passagem, o celebrizararam, e deram origem à célebre alcunha de "Amélia das Marmitas".
Não pense o comum leitor que estava perante um cidadão de mobilidade reduzida, não, isso são tretas do Politicamente Correcto, e o Zé Manel, que deus tenha, já tinha dado a volta ao politicamente correcto talqualmente ele o merece: com uma muleta bem enterrada no cu. A Amélia das Marmitas era tudo menos mobilidade reduzida: não havia escadaria íngreme, rampa esburacada, ou valeta que não calcorreasse, a uma velocidade muito próxima... bom, vou evitar os exageros... a uma velocidade muito próxima, já que não da luz, do som.
Havia sempre o broche seguinte que tinha de ser despachado, e não havia poliomielite que não pusesse aquela "m'lher" a bater tudo o que havia para bater nessa Lisboa Desaparecida, que aquela canhota -- uma tal de Marina -- que vive disso, seria incapaz de reproduzir nos seus inúmeros álbuns do ganha-pão.
Tinha-lhe dito a médica assistente que não compreendia como é que ele, naquele estado de degenerescência física, ainda não estava na cadeira-de-rodas em que outros, na mesma fase, já estariam. Não sabem as médicas que a voragem do engate deve ser das poucas coisas, para além de Jesus, capaz de pôr os paralíticos a andar, e punha.
A verdade é que a Amélia das Marmitas era uma senhora: chegava defronte das louças de Sacavém, quer fossem no "Olympia", em Santa Apolónia, no "Palladium" ou no Terminal do Rossio, encostava imediatamente as muletas ao lado esquerdo do sanitário -- era vagamente de Esquerda, e cultíssima -- e colocava a anca encostada ao lado direito do mijadouro, tornando assim a deficiência mimética com um colo de cisne, tipo Leda, a que entregava langorosamente a anca. Depois, era só esperar que a presa pousasse no sanitário do lado, e, consoante o tamanho da trombinha, trombeta, ou trombada, ela lá delicadamente deitava a unha: às vezes, o cavalheiro casado, ainda tentava aquele derradeiro sobressalto do toureador, antes de ser encornado, mas depois percebia que aquela mãozinha de branca de neve ia operar todas as maravilhas que lhe faltavam em casa.
Da mão à boca, era um passo, aliás, uma muleta, no caso da Amélia das Marmitas.
Nesse tempo, eu, púbere, imberbe e envergonhado, costumava ir-me embora, mas tenho de reconhecer que a arte do contorsionismo era um dos "métiers" da nossa amiga, já que, do ponto de vista da Física pura, uma criatura que não se tinha nas canetas, mas, mesmo assim, conseguia debruçar-se para o urinol do lado, para fazer uma "gulosa", daquelas inesquecíveis, e não cair, era um dos milagres da fé. Creio que Santa Teresinha sempre o apoiou nas lides, e não lhe vão faltar madrinhas para entrar no Céu.
Como todas as grandes paneleiras, a Amélia tinha uma queda pelo Oculto. Na fase final, em que a Sina nos uniu, na reorganização do espólio de uma Biblioteca Pública, vira-se um dia para mim, eu, com o meu ar de puta angélica do costume, e diz-me assim, "sabe, um diz destes fui a uma vidente, e ela olhou para mim, e disse, não quero desiludi-lo, mas você vai ter uma vida muito mais inclinada para o "flirt" do que para o Amor..."
Mal a desgraçada sabia quantos "flirts" de homens das obras já tinham passado por aquela goela, e o amor, realmente com que ela "flirtava", sempre que se tratava de mamar...
Vidas.
Uma vez senhora, todavia, sempre senhora. Lembro-me, naqueles pontos de fuga que davam para ver tudo o que se passava lá dentro, estar eu um dia à espera do comboio de Sintra -- Watchdog, tempos de passagem regular pela Damaia!... -- e ver a Amélia lá no canto, muletas à esquerda, bacia à direita, e entrar um gajo com ar de baixo nível, tipo canalizador, daqueles com barba de três dias, e fato de macaco todo cagado, coisa de fazer subir a adrenalina de qualquer bicha aos zénites com que o badochas do Constâncio fala de centésimas, e, e em trinta segundos, a Amélia ter abocanhado a presa. O seu carácter de princesa, todavia, logo se manifestou, porque -- só depois deu para ver -- havia um típico casado de bigode, no outro extremo, e, depois de ter iniciado o acto, a Amélia fez aquele gesto com que, na Valsa, um parceiro cede o lugar ao outro, e ofereceu a tromba rija, para o que o cavalheiro casado também pudesse fruir da benesse.
Uma "lady".
A Amélia era uma dama do Calvário: morava perto da Super-Esquadra, e tinha a sorte de ser vizinha de um daqueles apartamentos onde se amontoam três ou quatro polícias, com os quais -- dizia ela -- mantinha excelentes relações, e espero bem que sim, a bem da Ordem Pública... Conta-se que descia à paragem do 38, hoje 738, se não me engano, e, sempre que apanhava um cavalheiro das horas tardias, ou um jovem a cambalear das discotecas, lá vinha ela, truca-truca-truca, com as marmitas a matraquear na calçada portuguesa, e abordava-o directamente, perguntando se não queria que o mamasse, ao que -- parece -- a pergunta era "Você é de confiança?..."
Claro que a Amélia das Marmitas era da mais profunda confiança: levava-o para um vão de escada e nunca ficavam provas, já que engolia, assim evitando aquelas feias queixas e resmungos das pobres lava-escadas do dia seguinte.
Não menos rico do que o seu lado de brochista era a vertente cultural: a Amélia das Marmitas era assídua frequentadora do São Carlos, e os primeiros e mais altos "BRAVOS" de qualquer ópera vinham sempre dessa goela oleada de esperma, para inveja de muitas tias, que desconheciam de onde vinha o inconfundível timbre daquela voz: e aqui fica o segredo, durante tanto tempo guardado.
Episódio célebre foi o seu cruzamento com a saudosa Maria Helena de Freitas, passionária e apaixonada de todo o bel-canto, que, uma vez, na coxia central da plateia, com o Zé Manel à frente e ela atrás, o Zé Manel, sempre cortês, no seu truca-truca-truca das marmitas, ao pressentir atrás de si a velha amante de Luís de Freitas-Branco, se virou para ela e lhe disse, "minha querida Maria Helena, faça favor de passar!...", ao que a outra terá respondido, "Ó, Zé Manel, por amor de deus, deixe-se estar, que está à minha frente, e eu sempre respeitei as bichas..." Coitada, só no segundo seguinte se apercebeu do que tinha dito...
Do Zé Manel, a "Amélia das Marmitas" ficará este testemunho, que, embora humorístico, é sentido: foi mais um mundo que desapareceu, um mundo com graça, por oposição à atmosfera parda em que estamos imersos: parece-me ainda estar a vê-lo, com as muletas, a deslocar-se a uma velocidade impensável para qualquer dos nossos leitores, mas que não era só movimento, já que, como naquela peça... acho que se chama "Shakespeare em 97, ou 79, ou lá como é minutos" (nunca vi, mas parece que é divertida), a Amélia das Marmitas, no seu inimitável colear, era uma espécie de "Lago dos Cisnes em 30 segundos", porque bastava filar a presa e lá começava ela a marchar imediatamente na sua direcção, e aquela jibóia do broche realmente condensava todos os "pas-de-deux", as espargatas, os solos e até os "Tutti" de Tchaikovski desde que lhe cheirasse a mamar um homem.
Não sei quanto casamentos salvou, sei que era uma criatura de territórios: para o lado do Casal Ventoso, não ia, porque os rapazes eram para a assaltar; do outro lado da rua, dizia -- não me lembro do nome -- os rapazes gostavam dela, e terá tirado muitas virgindades com a boca.
A nota final é ainda mais realista: aparentemente a Alemanha, dominada pela Sinistra Merkel, está-se a preparar para estender a idade de reforma das Forças de Segurança para 67 anos (!), o que quer dizer que vamos ter P.S.P.s e G.N.R.s a correr atrás de gandulos de bonezinho e briqnuinho, eventualmente com muletas do mesmo género das do Zé Manel. Suponho que o Zé Manel odiasse mamar polícias com 67 anos, e a Morte livrou-o de mais esse pesadelo de Bilderberg... Brevemente, o grito dos guettos talvez já não seja, "OLHA, A BÓFIA VEM AÍ!...", mas, sim, "PESSOAL, TOCA A BAZAR QUE VEM AÍ A BRIGADA DAS MARMITAS".
Mais não escrevo: é um epitáfio excêntrico para mais uma grande fatia de um mundo exótico que se foi.
Descansa em paz, Zé Manel, levou-te um terrível linfoma, mas deixas cá saudades: o riso com a notícia da tua morte talvez tenha sido a maior prova de simpatia de todos quantos contigo privaram, te conheceram, ou, tão-só te viram, libertaria e anarquicamente, a sabotar, diaria e sistematicamente, a Ordem das pessoas que, cada vez mais, adoram mundos pardos e amordaçados.

"The Braganza Mothers", no dia do 2º Aniversário da Morte de Amélia das Marmitas


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terça-feira, 13 de abril de 2010

A "Fundação Amélia das Marmitas" adere, a partir de hoje, ao Concurso "As 7 Maiores ex-Maravilhas de Portugal"


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Leya Aqui, e vote AQUI

sábado, 27 de março de 2010

A um mês do seu segundo aniversário, a "Fundação Amélia das Marmitas" já é um sucesso mundial :-)))


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O memorial do saudoso Zé Manel das Muletas vai aderir ao PEC, e poupar na energia, gastando menos água nos lavatórios, menos papel higiénico e menos eletricidade, passando a estar menos tempo a fingir secar as mãos, para ver os mangalhos pelo reflexo do espelho... Patriotismo... :-))))

sábado, 13 de março de 2010

Faça como a "Fundação Amélia das Marmitas", e vá à sua prisão dar-lhe aquilo de que ele tanto precisa...



domingo, 7 de março de 2010

Fundação Amélia das Marmitas já se disponibilizou para prestar serviços mínimos, e não só, ao Violador de Telheiras, enquanto estiver detido


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Yes, we want him!...

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

A Fundação Amélia das Marmitas associa-se ao Natal dos Desesperados


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SERVIÇO PÚBLICO: DADA A QUADRA FESTIVA, EM QUE OS MAL CASADOS E OS FORÇADOS A NAMORAR TÊM DE ANDAR COM A "TRALHA" TODA ATRÁS, A FUNDAÇÃO AMÉLIA DAS MARMITAS ASSEGURA, ATÉ ÀS 22 HORAS DO DIA 24 DE DEZEMBRO E ATÉ ÀS 22 HORAS DE 31 DE DEZEMBRO PIQUETES DE APOIO À MAMADA RÁPIDA, NOS HABITUAIS POSTOS DE ATENDIMENTO. PARA IDENTIFICAÇÃO, TEREMOS UM DISTINTIVO "UM NATAL, UMA BOCA". (Em caso de dúvida pergunte ao segurança mais próximo onde nos encontrar)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A "Adolfa" de outros tempos


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Uma das personagens do já longínquo imaginário da Época das Luzes do bichedo lisboeta, era uma autêntica avant-garde anterior ao avant-garde e que dava pelo nome de "Adolfa"(1).
Mesmo antes de ter começado a deambular pelas noites de sexta-feira, em que tínhamos de chegar à Emília (2) por volta das dez da noite (tal era a turba à porta), já eu conhecia de vista a dita Adolfa. Mulatinha de Moçambique, vestia-se de uma forma muito estranha para um ano de 1979, onde se os betos já trajavam tal e qual como os CDS/PP de hoje (calça de fazenda cinza ou jeans, camisa branca com riscas, pull-over azul marinho ou bordeaux, mocassins, etc), o resto da cangalha andava como sempre. Uns de calça vincada e outros de Rica Lewis, Loys ou falsíssimas Lavi's da feira da Ladra, não esquecendo os conjuntos de bombazina da Mustang, por exemplo.
A Adolfa era especial. Calças tufadas e metidas dentro de botas pontiagudas, camisolas de gola alta de lamé às riscas, um casaco apertado na cintura e de ombros exageradamente armados, bandas largas e claro está, a inevitável estola de quinquagésima mão, comprada na até há pouco ainda existente Mme. Campos (Largo da Trindade), onde um bicho qualquer mordia o próprio rabo peludo, enroscando-se à volta do comprido pescoço de garça da crioula. Uma pochette ou mala de indefinível sexo, fazia o conjunto, a que o chapéuzinho de feltro anos 30, emplumado ao estilo da Dietrich, dava o toque final. Claro que na altura, toda a gente olhava e via-a passar, sem nada dizer. Era uma figura típica que calcorreava o Chiado e tomava uns chás na Imperium, fabuloso café/salão de chá, outrora existente nas escadinhas do Elevador de Sta. Justa, onde hoje existe uma terceiro mundista pastelaria de alumínios, azulejos tipo-WC e lataria anexa. Era a ainda existente Lisboa dos passados anos 40, que à bicharada servia chá em serviços de Cristoffle e cujas paredes se encontravam cobertas com pinturas murais salazaristas, evocadoras de descobrimentos, ou de guerreiros que há muito se foram. As janelas eram debruadas com pesados cortinados de veludo cor de vinho e o pessoal muito bem composto por senhores de respeitável idade e de aristocráticos cabelos prateados, impecáveis em uniformes que hoje os fariam passar por diplomatas das Necessidades de outrora. Nas mesas e além daquelas ocupadas pela bicharada, lá estavam todos os dias as senhoras de cabelo violeta, colares de pérolas, uma ou outra com pequenos véus transparentes e mosqueados, boquilhas de prata, chapéu com penas, malas pretas e luvas a condizer. Nada de putedo de perna ao léu ao estilo da linha actual regime RTP/SIC/TVI/Caras/Flash. Outros tempos em que a tipologia do Cinhismo ajardinado, se passeava então no Cais Sodré e ruas próximas! E isto até meados dos anos oitenta. O que deitámos fora, por culpa da canalha yupee que o Cavaquistão pariu...
Pois bem, a Adolfa era uma vital parte do visual lisboeta e sinceramente, nunca soube o que fazia da vida. Estava em todo o lado, fosse na Baixa, no Príncipe Real ou para os lados do Saldanha.Rebolava-se por aqui e por ali e isso já era um programa planeado para umas décadas. Conhecia-a de vista, era tudo.
Quando comecei a sair, é claro que esbarrei logo com essa estrela nos sítios do costume e embora jamais tivéssemos falado, existiam conhecimentos comuns e impossíveis de contornar num meio ainda razoavelmente restrito. Uma tarde, fui com um colega da faculdade a casa de "uma amiga" que vivia para a zona da linha de comboio da Av. de Roma. O apartamento era confortável, bastante burguês pré-25 de Abril, mas já perfeitamente adaptado às necessidades político-sociais do momento. Os papás do João tinham virado "comunistas ferrenhos" e sobre as consolas douradas do hall e da sala, lá estava todo o oportuno lixo comprado nas bancas do PC no Rossio: medalhas do Lenine contracenando com bailarinas de porcelana de Meissen, bandeirolas com a foice e martelo mesmo ao lado de patos em cristal Murano, autocolantes aqui e ali, fotos do Cunhal e até um busto de uma sopeira qualquer, uma tal Catarina Eufémia, famosa entre as regateiras da época. Sobre a mesa de apoio ao salão, o Avante!, o Diário de Lisboa, uma ou outra ilegível revista russa e a inevitável cigarreira de prata "do avô", para servir os camaradas de tertúlia progressista. Era a época em que sobre os braços dos cadeirões forrados de veludo verde seco, pontificavam aquela espécie de cinturões em cabedal castanho, aos quais se atarraxavam cinzeiros dourados, muitas das vezes ostentando inexistentes brasões, etc. Franjas nas almofadas, uma natureza morta sobre side-board, um Cargaleirozeco, enfim, o costume naquela área da cidade. Dentro do gira-discos/rádio de madeira envernizada, lá estavam as agora bem convenientemente escondidas Amália, Madalena Iglésias, AntónioCalvário, Artur Garcia e um sem número de vencedoras da Eurovisão dos anos transactos. Bem à frente e em destaque, os chatarrões do momento, entre os quais sobressaíam o Sérgio Godinho, a ranhosa vózita do Zéquinha Afonso, o Correia de Oliveira, o José Mário Branco e outros besuntas que tais. Para a jóia decorativa da casa, o moderninho disco-dancer João, os super-êxitos da Glória Gaynor, Sylvester, Gabriela Schaaf, Dire Straits, On 3 Degrees e claro está, a grandiosa Amanda Lear e a já ostensivamente fufona nazi da Zarah Leander. Fiquei de boca aberta, tal a mundivisão oportunista que aquele re-neo-neo-realista apartamento mostrava. O tal João, decidiu-se por fim, a mostrar-nos os tesourinhos mais queridos do vasto rol de recordações da sua ainda tenra juventude. Consistiam numa infinidade de pequenos filmes caseiros filmados em Super-8 e nos quais surgiam alguns dos seus amigos de noite em cenas mais ou menos imaginativas e bem esgalhadas, autênticos happenings que não desmereceriam um Salvador Dali dos anos 30. Num deles, aparecia a Adolfa toda nua e após um sem número de peripécias dançantes, decidia-se a servir de candelabro, onde o seu terminal digestivo se tornava no receptáculo de uma enorme vela branca que depois de acesa, dava um pouco de luz a um ambiente onde os amigos se contorciam em ritmos exóticos e mais ou menos au ralenti Mata-Hari, devido à profusão de drunfos tomados. Agachada e de rabo para o ar, lá iluminava com o círio, os benévolos espíritos presentes. Lá estava também o Bino (3), um fulano absolutamente excêntrico, de olhos de carneiro mal-morto, voz rouca, sempre vestido de preto e bastante inteligente. A sua vida consistia numa ininterrupta série de fodas com rapazes quéques e estava sempre num sistema de falência psíquica-técnica, completamente drunfado das 8 da manhã às sete do dia seguinte. Após uma longa carreira de professor algures no Alentejo mais rural, decidiu-se a um renascimento espiritual, passando para uma confraria de hare-krishnas ali para a zona da Estefânia, onde não faltavam rapazes bonitos, de cabeça rapada e sempre vestidos com o conveniente balandrau cor de salmão. Não se comia carne de galinha, porco ou vaca, mas chouriço humano não faltava no retiro espiritual. Isso e inebriantes fumos que abriam caminhos para tudo e mais alguma coisa.
Outros nomes dessa época despreocupada em que se fodia em tudo o que era escada lisboeta, surgiam em mais uns tantos Super-8. Um dos que jamais esqueci, era um rapaz simpático e alto, benzoca e que invariavelmente mostrava nos filmes o inútil apêndice reprodutor, de exageradas dimensões e que para mais nada servia senão para evacuador de fluídos da bexiga. Um belo dia, já nos anos 80, decidiu-se ir a Marrocos, à demanda do corte do dito cujo e lá bem do alto dos seus quase 1,90m, tornou-se numa conceituada médica de profissão. Passou a ter aquele look um tanto ou quanto meio gasto das spinster da Avenida de Roma, com as meias de vidro, saias aos quadrados plissadas, e cabelo escorrido. Uma autêntica gaja, não fosse a altura descomunal que a todos os transeuntes fazia espantar. Como nome, adoptou o da personagem interpretada por Rita Hayworth num filme em que contracenava com Glenn Ford. Pasmem, mas andava sempre acompanhada pelos maiores matulões do Alfeite e dos "Páras". Incrível, nunca percebi como é que eles acreditavam que os demais não viam logo o esquema.
A Adolfa ainda bateu muita calçada de Lisboa e nos tempos Duran-Duran lá dava à anca no Trumps, ao som do That's the Look of Love. Com o tempo da parva gayzização do sistema, começou a época dos body-buildings á americana e assim o look macho-paneleiro tomou conta de tudo: no way para Adolfas anymore.
Um dos últimos episódios de que ouvi falar, foi aquele que lhe aconteceu já há mais de quinze anos. Habitualmente, ela passava as noites na esquina da Imprensa Nacional com a Escola Politécnica, catrapiscando taxistas e incautos distraídos que por lá circulavam de carro "por acaso" e a caminho da fofa e quentinha cama da esposa. Uma pestanada, um olhar fixo para dentro do carro que também por "mero acaso" abrandava e pronto! Lá dava ela a boca ao vício, até ao senhor que se seguia. Pelo que parece, numa trágica noite de tempestade levou um rebenta dos antigos e partiram-lhe um braço e uma perna, cometendo até a impudência de a terem atirado para dentro de um contentor de lixo das obras.
Pensam que a Adolfa ficou em casa a chorar? Qual quê?! Assim que conseguiu dar às canetas, lá estava outra vez de plantão, toda engessada, na esquina de todas as emboscadas. Firme e heróica, que nem uma Cavaca com pedigree!
Muito fica para contar, desde os bolos de haxixe e os ponches de Fringanor e Roiptnoil, até à famosa visita que um grupo de "amigas" fez num fim de semana na casinha da mãe da Adolfa lá para as bandas de Rio Maior. Já não bastava o escândalo público naquele perdido buraco do Portugal profundo, para ainda terem sido corridas lá de casa, após uma noite em que as criaturas resolveram transformar as lindas almofadas da sala da mãe da Adolfa. Forradas com capulanas onde surgia a sorridente carantonha de Samora Machel, decidiram reconvertê-las em algo de mais fashion, cosendo argolas de cortinados nas orelhas e pintando a caneta de feltro longos cílios sobre os olhos. Enfim, o ditador do Maputo surgia como uma espécie de Marilyn tropical.
Outros tempos, outras gentes, outra classe. Antes dos i-pod, i-phones e até dos telemóveis. Maldita tecnologia!


(1) O nome é muito parecido.
(2) O Bric a Bar de outros tempos
(3) O nome é parecido, quase idêntico


terça-feira, 20 de outubro de 2009

Biberons do Indostão


Neste blogue praticam-se a Liberdade e o Direito de Expressão próprios das Sociedades Avançadas


O Steve era um latagão americano, do Texas. Quase um metro e noventa de altura, musculoso como o Rambo, cabelo comprido louro e pelos ombros. Rude na fala, mas simpático e muito terra-a-terra, precisamente o contrário daquilo que hoje se conhece por comunidade gay e que tem tanto interesse como escarrar na sopa. Veterano da guerra do Vietname, foi condecorado por bravura em combate, embora a fotografia com a tal estrela prateada não fosse muito impressionante. Uma coisa é vermos um alemão ou um inglês de uniforme, ficando logo a saber que aquelas cruzes de metal tiveram um significado. Os americanos são outra coisa, porque por mais valentia gabarolada, tudo soa muito a falso. As medalhas são rascas e parecem ter saído numa rifa de feira Os uniformes são mais próprios dos gajos de empresas como a Securitas do que farpelas de heróis de combate. Cheiram a fake que tresandam. Lembram-se do capacete prateado do Patton e das pistolas de cowboy à cintura?
O tal gigantesco veterano começou a sua carreira de ordenhador em plena selva vietnamita, quando apinhada em buracos húmidos, quentes e cheios de insectos, a soldadesca foi encontrando formas de passar o tempo, chupando charros de erva ou pilas de colegas. Nisto, o ócio dos magalas de todos os tempos acaba por encontrar certos pontos comuns, até porque segundo consta, durante a nossa guerra colonial, muito pescoço enrijou de tanto esforço muscular acima-abaixo.
Pelo que o G.I.dizia, o primeiro na lista foi um aliado do Vietname do sul que o abocanhou e a insistência foi tanta que o Steve, desconfiado, também quis experimentar. Disaster! O resultado foi o que todos calculam e a partir daí, o matulão passou a despachar a unidade inteira, fossem os fornecedores de víveres wasps, jungle-bunnies, chinks, dagos, spics ou índios. Ele queria lá saber se eram gordos ou magros, bonitos ou feios! Infelizmente acabado "the best time of my life", regressou aos USA, onde descobriu coisas que até aí lhe tinham passado ao lado, passando a bater todas as esquinas, parques e chichis públicos. Depósito atestado numa época de escassez de combustível, lá voltava a casa para dormir umas horas. Não fazia a ponta de um corno, porque teve a sorte de receber um balázio numa coxa e outro no ombro, motivo mais que suficiente para se tornar num aldrabão "inválido de guerra", com uma pensão que lhe dava e sobrava, para nem sequer falarmos no seguro.
Foi-me apresentado por um amigo e após uma semana em Lisboa, lá veio com o estafado ram-ram do how fantaaaaastic Lisbon is, the best food, the best clima, the best dicks (?!). Alto lá e para o baile! Pensei que estava a ouvir mal ou que se tratava da cretinice típica dos yankees que estão contentes com qualquer coisa que ponham na boca, desde que seja salgada. Sem querer acreditar, perguntei-lhe como podia achar fantastics as dactilógrafas diárias de sítios como o Bric, Trumps ou Finalmente? Riu-se e esclareceu-me de que jamais tinha posto as patinhas dentro desses locais de tortura. Explicou então que se tinha especializado nas actividades de águas correntes, ou seja, nos chichis públicos. Para quem tinha chegado há poucos dias a Lisboa, o gajo sabia dos sítios de cor e salteado. Para mais, já vinha bem sabido dos USA, porque o famoso roteiro gay lá tinha tudo tintim por tintim.
Contou-me que só nesse dia, tinha abocanhado 26 enchidos nacionais. Nem quis acreditar (ainda hoje me custa a crer) e perguntei como é que ele tinha arranjado um número tão grande de tipos bons, ainda por cima nos "Ó"rinóis?
- Yeaaaah, you know, I'm just interested in dick, who cares about beauty?
-?
- If they are hard, I don't give a fuck if they're small or big, clean or dirty, young or old! They must to be full of milk, that's all!
Fiquei a saber que no chichi da estação fluvial do Terreiro do Paço, atacava logo bem cedinho pela matina, à coca da gandulagem que se aliviava antes de ir para o serviço. As manhãs passava-as ali, quase até à hora do almoço, momento em que ia logo a correr para a estação do Rossio, onde no último andar existia outra sala de ordenha muito conhecida e frequentada por distraídos passeantes que lá faziam uma perninha antes do regresso ao merdoso escritório na Baixa. O Steve não só mamava tudo, como ainda por cima, enchia o estômago! Garantiu-me que nem sequer precisava de comer durante o dia e a única coisa que sorvia (além dos produtos lácteos) eram Coca-Colas que o mantinham apto a arrotar e a adocicar-lhe o paladar. Este gajo era um fenómeno da natureza, até porque na época, a ordenha até ao fim podia (e ainda pode) muito bem ocasionar os contratempos que arruinaram tantas vidas felizes. Mas não, o Steve tinha um estômago de aço e completamente impermeável a qualquer vírus atrevido (1). Gostava mais ou menos de chouriços ligeiramente spicy with cheese, como ele dizia. Quer dizer, aquilo que dá vómitos à maioria, para ele era um manjar, saindo da sua boca limpinhos da Silva como há dez dias, a última vez em que tinham visto água e sabão macaco. Incrível, mas verdadeiro e chegou a bater recorde atrás de recorde. Pelas contas que fez na última noite que cá passou (fomos jantar ao Bairro Alto, onde ri até me cansar), o mês que cá esteve, foi suficiente para despachar mais de 600 enchidos nacionais, numa época em que a comunidade brasileira ainda não tinha descoberto as praias de onde saíram os antepassados. Mas o que mais me surpreendeu foi a aberta polivalência deste G.I., porque à noite, estando os sítios fechados para descanso, lá ia ele até às vacarias da Almirante Reis, onde arranjava umas duas putas só para a trombada!
Voltou cá mais umas vezes, batendo o Forte do Queijo e as estações da Campanhã e S. Bento no Porto e um ou outro apeadeiro da linha do norte. Mas a partir de um certo momento, com o imbecil pequeno-aburguesamento dos PS-PSD, as salas de ordenha onde tanta geral deu, foram fechando umas atrás das outras, nesta luta pelos bons costumes que as nossas autoridades passaram a praticar após a chegada ao poder. É que estes invejosos tornaram-se em caras conhecidas e com peruca ou sem peruca, com valise ou sem valise, com calhambeque ou bólide, eram logo reconhecidos e chulados, acabando por aparecer no Crime ou no Jornal do Incrível. Já que não podem foder nem mamar, zás!, acabam com o frú dos outros.
O Steve desistiu de Portugal e pelo que amigos comuns contaram, hoje vive feliz e contente na Índia, terra de todas as oportunidades e crenças. Alterna as costas a percorrer, ano sim ano não. O truque é sempre o mesmo. Logo de manhã vai ao povoado mais próximo e troca um punhado de dólares por moedas de uma Rupia. Dirige-se à praia e vai andando, andando, até encontrar uma aldeia de pescadores que estando em terra por causa da monção, não se ralam nada em receber uma moeda em troca da dose de leite a fornecer ao sedento estrangeiro. Despachados avós, pais e netos (às vezes em grupo), lá segue o seu caminho, tal e qual o novo judeu errante dos finais do século XX. Passa a noite numa espelunca qualquer e na manhã seguinte lá está ele praia abaixo, à cata de outra comunidade piscatória. E assim por diante, durante uns largos quatro meses por ano. Na campanha seguinte, troca de costa e lá começa a odisseia, descendo-a e visitando vilórias onde já tinha passado há dois anos.
Sabem como é que ele me descreveu a chegada a cada povoado? Disse-me que se lembrava sempre daquele filme do Indiana Jones, O Templo Perdido. Na cena final, quando estava a chegar à vila para devolver as pedras divinas, lá se via uma correria de monhés aos pulos, saltando dos coqueiros e dos altares em ruínas, numa mistura de Mogli com com uma final de futebol: correndo e guinchando como possessos, chegavam os Singhs, Priankas, Jalals, Abhijays, Chitramutras, Devashishs, etc. Era uma correria, de risos e gritos de boas vindas. O dia estava garantido e à noite, à volta de uma fogueira na praia, lá emborcavam todos uns paparis e um caril de peixe, mais que próprios para estimular o organismo na produção do precioso néctar de que o estrangeiro tanto necessitava.


(1) Não tentem fazer isso em casa de ninguém, nem no jardim, nem no lavabo do centro comercial. Não é aconselhável.


Não foi você que pediu uma Visible Technologies para ser espiado?


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terça-feira, 13 de outubro de 2009

"The Braganza Mothers", no dia em que a Fundação Amélia das Marmitas começa a exigir de António Costa o prometido, e a reabertura de brochanários


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FUNDAÇÃO AMÉLIA DAS MARMITAS: UM PACTO SECRETO QUE ANTÓNIO COSTA VAI TER DE CUMPRIR

Coisas camarárias: a Procissão das Velas de Carne




A velha-nova Câmara Municipal de Lisboa, tem andado a reinstalar os quiosques de outros tempos, estando desta vez as antigas tascas de vinho a martelo, transformadas em bancas de sumos tropicais, capilés, groselhas e cafés à la mode, com bolachinha de chocolate e tudo. São hoje pertença de meninas vagamente bloquistas, platinadas e vestidas de preto. Adoramos tudo quanto seja revivalismo e assim aqui vai uma sugestão para o presidente Costa, que decerto quererá fazer a vontade (e compensar o esforço eleitoral) a tantos e tantos companheiros de luta e de partido.
Os chichis públicos foram desaparecendo, substituídos por "Ó"rinóis mais ou menos marmoreados, de portas serradas e com rufiões-segurança, com ar de chulos de outros tempos. Estamos numa época de todas as invejas e nas minúsculas tolas dos gestores do mobiliário urbano (já que deixaram de poder frequentar os sítios), passou a ideia de ..."querem engatar? Então vão teclar para a net"!. Pobre e desvairada gente, esta de uma Lisboa que já viu melhores dias! Miseráveis, até acabaram com as duas carruagens no metro, que permitiam aqueles apertões e roçansos à hora de ponta. Quantas vezes qualquer Manel sentia, com um misto de temor e prazer, uma habilidosa mão sacar-lhe o equipamento para fora das calças, massajando-o até se abrirem as portas na estação seguinte? Galanços pelos vidros, perseguições nas "cobras" do Marquês, esperas intermináveis "a tirar inexistentes pontos negros do quéque nariz" em frente do espelho nos lavabos das estações... Enfim, outros tempos de liberdade "fássista" plenamente desfrutada por todos, antes da chegada dos pequeno-burgueses PS+PSD, merdosos telemóveis, i-pods, chat-rooms e popós para todos. Bons tempos!

Os "vespasianos" - nome à la parisienne - para os chichis públicos, pululavam por toda a cidade, desde as principais praças às avenidas, cruzamentos e até, em pequenos becos dificilmente descortináveis para os não iniciados na irmandade. Numa época em que a posição de missionário ditava a regra nas relações matrimoniais, os matulões da cidade lá iam aos vespasianos, à cata de uns minutos que em casa lhes eram totalmente interditos pela Zulmira de bata, rolos no caspento cabelo oleoso e buço a despontar. Uns mais velhotes, outros acabados de entrar ou sair da tropa, fedelhagem dos liceus, todos, todos lá iam para o mesmo. Entravam, demoravam, saíam, voltavam a entrar e isto, horas e horas a fio, até doerem os joelhos de tanta "andança" peregrina.
Pois bem, esta pequena estorieta de tempos muito anteriores às saunas onde hoje e inutilmente as bichas se perseguem umas às outras à espera do impossível, foi-me contada por um ainda bem vivo e respeitável antiquário e é tão verídica como o fim das fodas Made in Underground Station. Situa-se mais ou menos entre os anos 50 e a época anterior ao 25 de Abril, embora muita acção tivesse continuado até à chegada da CEE.
Há uns quarenta anos, existia um grupo bastante heterogéneo, composto por rapazes da alta e por outros mais, digamos, ao estilo da linha Poço do Borratém/Madragoa, que várias vezes por semana se organizava para a "Procissão das Velas de Carne". Alguns tipos da zona da Avenida de Roma e das Avenidas Novas, um ou outro que vinha de Cascais acompanhado pelo filho da porteira, encontravam-se no Rossio com o grupo do costume e lá partiam alegremente em direcção ao Campo das Cebolas, onde se iniciava a função. Nas férias tinham o dia todo, uns libertados finalmente das aulas e outros, naquele desemprego conveniente que se transformava aos poucos em profissão, pois quando a noite caía, sempre havia alguém pronto para lhes deixar uns cobres no bolso, podendo assim chegar a casa com ar estafado: ..."Ó mãe, o jantar tá feito? Hoje buli p'a caralho"...!
Pois bem, pelo que me disseram, a táctica era sempre a mesma. Esperava-se cá fora e os amigos lá decidiam consoante as preferências de cada um. Havia quem gostasse de mais novos e outros, de mais velhos. Havia quem se orientasse e outros que faziam o servicinho graciosamente. Uma questão de coordenação que evitava disputas e as invejas daqueles que mais gulosos, achavam que tudo o que vinha à rede era peixe. Assim, pelo Campo das Cebolas lá ficavam, até porque se situava nas imediações da estação fluvial, sempre um bom ponto de passagem dos esfomeados magalas a caminho de Santa Apolónia ou do Alfeite. É que estes combates requerem conhecimentos de estratégia, porque este local, servia também de ambiente aos estivadores e pessoal das alfândegas. Segundo a tradição oral, pessoal não faltava e esquisitices era coisa inexistente. Que diferença destas bichólas de hoje, magricelas, de ombros a dar-a-dar de lado, ao estilo das pinturas tumulares egípcias... Cheias de madeixas, quase inexistentes cús a sair para fora das calças baixadas até meio das pernas, piercings, pulseiras, brinquinhos, tatoos tribais e mariquettes à bandoleira. Que porcaria, que tira-tesões, que bando de paneleironas Chiado acima, Chiado abaixo! Naquela época, onde os jeans pertenciam exclusivamente aos futuro-comunas ricaços da geração Tordo/Louçã/Paulo de Carvalho, um homem que se prezasse, usava calça de fazenda com vinco, meias e camisa branca ou aos quadrados. Não haviam ténis para ninguém, embora às vezes lá aparecesse um benzéssimo aluno do Pedro Nunes, calçado com alpergatas "Sanjo" e prontinho para rechear a rósea e macia protuberância traseira com um um compressor rolo proletário.
Esgotado o filão ou acabada a pachorra, lá seguia a procissão até à próxima paragem, no bem conhecido paradouro do Terreiro do Paço, em subterrâneos dignos de Pompeia, onde tudo era à descarada. Foi aí mesmo que pela primeira vez, vi as coisas como eram. A Lisboa revolucionária, pretensiosamente cheia de "superioridade moral" do PC e de murais do MRPP, em certos aspectos não olhava a distinções de classe social ou de educação. Até gente dos ministérios saía dos escritórios para "apanhar um pouco de ar" e calcorreando a vasta praça, lá ia satisfazer as necessidades mais prementes, mesmo diante do guarda do WC que estando-se cagando para a faina dos outros, lá ia intercalando a leitura do Avante! com a d'A Bola.
A procissão seguia depois pela Rua Augusta e por vezes, dada a lata do grupo, lá havia alguém que despachava nesta ou naquela escada de serviço dos magníficos prédios pombalinos, à altura ainda ocupados totalmente por velhotas de burka negra, "senhores Zés" em camiseta interior, chapéu de feltro e prato do Benfica sobre a telefonia. As escadas eram quase tão seguras como a próxima estação de serviço, a esplendorosa, gloriosa, ampla, malcheirosa e muito concorrida catacumba do Rossio. Ena pá... aquilo é que era e até a turistada de verão logo aprendia a conhecer o sabor lusitano, naquele antro ligeiramente furtivo e sombrio. Ainda me lembro de um autêntico bacanal que lá ocorreu, em plena tarde de campanha eleitoral em 1980, com uns tipos da AD a foder com outros da então FRS (PS mais quistos, ou sejam, a ASDI e a UEDS do Lopes Cardoso). Até havia gente que se revezava na assistência aos fregueses, diante de todos e sem que se escutasse um protesto ou gemido, a não ser o prazer que se adivinha. Às sextas era um fartote, porque chegara o dia de regresso à santa terrinha de tantos e tantos matarruanos que normalmente, acabavam por telefonar para o café lá da aldeia, mandando a sopeira dizer à mãezinha que ..."vamos de manobras este fim de semana", aboletando-se depois em casa de um dos bem-aventurados penitentes. Subindo a Avenida, lá estava um chichi de tantos a tantos metros. No Marquês, idem e assim, subindo o Parque lá se palmilhavam as calçadas a caminho de Campolide, parando também em Sete-Rios, outro centro nevrálgico de esperada actividade(1). Já para o fim da tarde, bem batidos, estourados mas plenamente gratificados, os convivas lá se sentavam um poucochinho no jardim da Luz, porque até ali (percebem porquê?) a coisa funcionava e de que maneira.
Era a procissão das velas de carne do Caeser Vespasiano, aquele grande homem que criou um dos símbolos máximos de uma civilização que hoje parece ter os dias contados.

(1) Já em plenos anos 90, conheci um americano que dava pelo nome de Steve. Tornou-se especialista em mamadas no Cais do Sodré e no Terreiro do Paço, chegando ao ponto de conseguir perto de trinta por dia. Mas isso, fica para outra crónica. Actualmente vive na Índia e imaginem lá o que anda a fazer. Prometo que a estória é fabulosa.

domingo, 27 de setembro de 2009

A "Fundação Amélia das Marmitas" saúda o novo Primeiro Ministro de Portugal, Paulo Portas

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quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Com o fim da Semana Europeia da Mobilidade, A Fundação Amélia das Marmitas reabre nas suas novas instalações



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Há precisamente um ano e cinco meses, a saudosa Amélia das Marmitas foi levada para o Além, pela mão do Senhor. Não foi a sua incapacidade motora que a impediu de ter uma vida feliz: chupou e viveu, e levou a barriga cheia, coisa de que poucos de nós nos podemos gabar. Após um período de instabilidade -- sim, tivémos pressões da Opus Dei, a Maçonaria tentou infiltrar-se, havia lavagem de dinheiros sujos, e escutas falando de Paulo Pedroso -- limpámos tudo, e a Fundação Amélia das Marmitas reabre ao público com um rosto novo. Que a todos agrade, porque a grande Cultura sempre se construiu na borda dos urinóis, e não na borda da cama, como diz, e pratica, a Clara Ferreira Alves.

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