Quinta-feira, 11 de Setembro de 2008, 21,30, SIC Notícias: Crespo entrevista o presidente do STJ, juíz conselheiro Noronha do Nascimento.
Sobre isto duas coisas:
1) As banalidades do juíz sobre o mundo do crime mostra que ele e a casta a que preside não têm soluções para o mundo actual, permanecendo a sua retórica num jogo do gato e do rato onde se procura dar a aparência de saber aquilo que não se sabe e, no fundo, se despreza - os sujeitos que por variadas razões comparecem nas barras dos tribunais.
2) O imperativo categórico kantiano do juíz.
Diz o juíz que os povos do sul do mediterrâneo não interiorizaram o imperativo categórico kantiano, ao contrário dos da Europa do Norte. Ora ele pertence a uma casta que tem a fama e o proveito de ter contribuído para isso durante 48 anos de ditadura através do afastamento insanável do povo rasteiro relativamente aos cargos dos "dirigentes" desta merda toda. Diga-me lá Sr. juíz como é que depois se pretende que a merda do povo interiorize (interiorizar é engolir, não é?) o que quer que seja?
A seguir Crespo faz o inesperado - "imperativo categórico que é...?", segue-se uma pausa e o juíz, aquele que acha que os povos do mediterrâneo não engoliram o dito cujo, responde-lhe como só um juíz po de responder, com a autoridade com que se acha investido sobre o comum dos mortais: "não me vai fazer um exame, pois não". O gajo já se habitou a examinar os outros, agora não quer outra coisa. Pois não Sr. juíz, até porque o Crespo confessa a ignorância sobre a coisa. Mas se fosse no tempo da outra Senhora, aposto que isto não ficava por aqui e o Juíz que agora não se quer submeter ao exame do Jornalista arranjava maneira de lhe dar umas mocadas nos cornos. Respeitinho é muito bonito, por isso é que esta merda toda está como está, não é querido?
Entretanto, eu - com a horrivel mania de visitar os pormenores das coisas - lá peguei no cardápio para tirar as dúvidas sobre a matéria e na Fundamentação da Metafísca dos Costumes, do nosso amigo Kant, lá vi aquilo que me parecia que tinha visto estampado num daqueles manuais de filosofia do secundário, já de há muitos anos atrás. E lá dizia que "O imperativo categórico é portanto só um único, que é este: «Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal» o que também se poderia expressar assim: "Age como se a máxima da tua acção se devesse tornar, pela tua vontade, em lei universal da natureza». Por aqui dá para ver que a coisa é tão difícil, senão mesmo impossível de levar a cabo, que o próprio juíz é a prova disso mesmo não sendo capaz de a reproduzir nem entender. É claro que para se tornar lei universal uma acção humana tem que estar despida daquilo a que Kant chamava matéria empírica dos sentidos (as inclinações). Portanto não se trata de interiorização coisa nenhuma. Trata-se exactamente do contrário: trata-se de saír de si em direcção à universalidade da lei (seja lá isso o que fôr), embora através dos princípios unicamente ao alcance da vontade humana, princípios afectados subjectivamente e chamados «máximas». Por isso o imperativo categórico manda que a máxima da minha acção se torne lei universal (ou para ela tenda). A concepção empirista da lei (herdada de Hume) está aqui bem patente e exige um tal desprendimento em relação a este mundo que não admira que na Crítica da Razão Prática o homem vá trabalhar o conceito de santidade. Realmente isto só seria acessível a santos e provavelmente nem a esses. Também não se trata, como diria o juíz, de respeitar o dever dos outros. Na Fundamentação da Metafísica dos Costumes o dever chega a ser caracterizado como «vazio» embora reconhecido como conceito inevitável e não se vê como respeitando o dever dos outros (só se fôr o dos juízes) se poderia aceder à lei universal. Respeitar o dever dos outros implica que os outros respeitem o meu dever e, naturalmente, se eu estiver munido de mais poder posso dobrar a concepção do dever aos meus interesses particulares, às minha inclinações e a partir daí entro inevitavelmente na subjectividade abandonando a tão pretendida objectividade da lei universal, aquela que arrasa com as contradições inerentes ao mundo dos fenómenos.
Esta falha revelada por este juíz não surge por acaso. É fruto de um sistema que selecciona sujeitos imbuidos de um inchaço narcísico tão grande que julgam que não é necessária reflexão alguma sobre os fundamentos da lei. Sujeitos que têm uma concepção privada da administração da lei - neste sentido aproximam-se da República de Platão e dos Reis-Filósofos numa representação tão irreal e ilusória sobre si próprios que só mostra o patético que os anima quando se expoem nesta república dos juízes - e que a tratam como uma "objectividade" sua tornando-a assim tão subjectiva que só fica ao alcance da retórica típica dos piores advogados. Sujeitos que vivem numa casta separada da vida civil e que a desprezam. Sujeitos que só falam nos grandes nomes da cultura e da filosofia como uma forma de vaidade desprezando no entanto a actividade intelectual. Sujeitos que separam o poder do saber perseguindo o primeiro em detrimento do segundo. Sujeitos que valorizam as profissões ligadas ao mundo da lei apenas na exacta medida da sua ambição e sede de poder.
Uma tristeza...
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3 commentaires:
estes têm beneficiado muito da iliteracia e ignorância de todos nós... mais "repeitados" e temidos que PR ou governantes!
urge denunciar sistematicamente este estado de funcionamento desta casta, como tem sido denunciada a casta médica!
Depois das estatísticas comprovarem que somos o povo europeu em que uma maior percentagem apoia McCain, eis que se revela mais outro traço magnífico com laços transatlanticos à lixeira neo-liberal: o poder absoluto dos juízes. Como todos sabem por documentários, o juiz nos US está acima de toda a lei. Ele É a lei e qualquer gesto contra sua senhoria levará a que se sofra uma espécie de castigo divino. Isto verifica-se acima de tudo nas cidades pequenas. Tal é a mentalidade que, pelos vistos, por cá grassa (espero eu que não de forma geral)...
O Imperativo Categórico reina nos transportes públicos, aliás, reina em qualquer sítio em que se reunam mais do que dois Portugueses, é por isso que eu, à prudência, e para evitar que houvesse mais desgraças, nos meus bons tempos, considerava que três já eram manifestação... do imperativo categórico.
Pouco evoluímos, desde então.
As caixas de comentários dos blogues estão cheias de imperativos categóricos.
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